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23 de jan. de 2019

Justiça Restaurativa ajuda na reconstrução de vidas de mulheres vítimas de violência doméstica

Dani Cunha

Os ciclos de conversas e palestras realizados na Primeira Vara Especializada de Violência Doméstica e Familiar contra Mulher de Cuiabá têm mudado a vida de mulheres vítimas de agressão em seus lares. O olhar a essas situações tem como pano de fundo o Direito Sistêmico e as constelações familiares, métodos que têm recebido grande investimento do Poder Judiciário de Mato Grosso, que vem apostando cada vez mais na política de expansão da conciliação e mediação e, consequentemente, na seara da Justiça Restaurativa.
Quem sentiu de forma positiva os resultados desse trabalho foi a manicure Rosângela*. Ela frequentou as palestras após viver relação de conflito e receber ameaças do companheiro, com quem viveu por 11 anos. A coragem para dar o primeiro passo surgiu com o apoio da tia, que mora em Cuiabá e a acolheu em casa. Rosangela, então, deixou o Estado onde morava e veio para Mato Grosso com os dois filhos para recomeçar a vida.
Ao chegar à Capital, com o estado psicológico bastante abalado e fazendo uso de medicação, ela buscou no Fórum de Cuiabá o auxílio de que tanto precisava. Segundo ela, isso mudou sua perspectiva de vida. “Minha autoestima está ótima, estou tão bem comigo mesma. Eu só ficava deitada, mas depois que participei da palestra e escutei o juiz falando que a gente não é obrigada a voltar ou ficar com uma pessoa que te faz mal, que a gente é capaz, eu levantei da cama, procurei emprego e hoje tenho uma ocupação”, relatou.
Feliz com a vida que tem hoje, Rosângela diz que é muito difícil pôr fim em um relacionamento abusivo ou agressivo. “Deixar para tudo para trás não é fácil. Tem que ter coragem e ambição de sobrevivência, principalmente no meu caso, que deixei casa, móveis que custei a comprar. Olhei no espelho e disse: não preciso mais disso, preciso ficar bem, pelos meus filhos. Eu tinha que conseguir tomar essa decisão de sair fora. É difícil, mas a gente consegue”, afirmou.
Rosângela recorda com emoção da palestra que participou na Vara de Violência Doméstica, pois compartilhou as suas vivências e disse que a dinâmica utilizada foi primordial. “Lembrar daquele dia é muito forte porque eu fiquei no centro, girando e olhando em cada olho. Quando fiz isso, foi inexplicável, como se eu vivesse o problema delas. Aquilo foi me ferindo, me machucando. Ao mesmo tempo vi que elas estavam ali querendo o mesmo que eu, a mesma força, a mesma ajuda, e, de alguma forma, ser vencedora. Sair do sofrimento foi libertador. Chorei, todas choraram, senti que o abraço de cada uma foi puro e verdadeiro”, contou, com os olhos marejados.
Esse trabalho foi idealizado pelo juiz Jamilson Haddad Campos, titular da Primeira Vara de Violência Doméstica de Cuiabá, e promovido por ele e pela consteladora Gil Thomé. O magistrado explica que essas práticas permitem um novo olhar com relação ao rompimento desses padrões destrutivos, que geram a delinquência e a desagregação nas relações e implicam de maneira negativa na vida em sociedade. Ele falou sobre o resultado prático desses métodos na vida das pessoas.
“Na hora que elas tomam consciência das leis sistêmicas, automaticamente fazem uma reflexão, tomando conhecimento da origem dessas dores, da repetição de padrões de comportamento e, com isso, elas ganham força para o empoderamento, um fortalecimento, uma compreensão para romperem com essa relação doentia”.
Há quase três anos a Primeira Vara desenvolve esse trabalho e o foco é esclarecer às mulheres que existem trabalhos que permitem a elas que saiam desse ciclo de relações familiares violentas. A dinâmica consiste em palestras de aproximadamente duas horas e meia. Por meio de exercícios são demonstradas quais são as posturas que permitem que elas tenham relações saudáveis.
“Às vezes se eu tenho uma postura vitimizada, vou atrair para mim uma pessoa que é mais violenta. Carregamos dentro da gente um determinado perfil e esse perfil determina o tipo de relações que nós vamos ter no mundo, com a nossa família. Se eu carrego uma postura de vítima, vou atrair uma relação um pouco mais violenta. Esse trabalho de orientar as pessoas, de onde vem essa postura vitimizada, permite a elas encontrar uma postura mais empoderada”, falou Gil Thomé.
Além da vítima, a consteladora disse que é possível também fazer trabalho com os agressores, buscando que eles mudem sua conduta. “Qualquer comportamento que eu tenha e que observe que é um trabalho nocivo, que não me traz benefícios, é possível sim fazer mudanças, mas primeiro é preciso querer para conseguir fazer uma mudança definitiva através de trabalho de autoconhecimento”, salientou.
Para as mulheres que passam por situação de violência doméstica, Rosângela deu conselho e disse para procurarem caminhos e buscar o apoio necessário, como ela mesma fez quando procurou a Primeira Vara Especializada de Violência Doméstica e Familiar contra Mulher de Cuiabá. “Em primeiro lugar, busque a Deus, porque sem ele não tem como. Segundo busque a sua força, que você tem que procurar onde ela estiver, porque senão não consegue, e busque a ajuda de profissionais e então você conseguirá retomar sua vida”, finalizou.

*Nome fictício para preservar a identidade da personagem.

Fonte: Extra MT.

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Livros & Informes

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