SÃO PAULO - Quase mil escolas estaduais estarão inseridas em 2009 no programa Justiça Restaurativa - que cria grupos de reflexão para discutir atos violentos. Esta é a principal aposta do governo do estado para reduzir a violência nos estabelecimentos de ensino. O número de escolas vai mais que dobrar: passará de 414 para 916 - 505 a mais.
A escola Amadeu Amaral, do Belém, na zona leste de São Paulo - que foi destruída pelos alunos no mês passado, não faz parte das 916 escolhidas para o programa. Na escola Amadeu Amaral, alunos subiram até no telhado para quebrar e jogar as telhas. O prejuízo foi de R$ 180 mil. A única punição para os 12 estudantes identificados foi a transferência para outra unidade.
No total, são 5.500 colégios estaduais no estado e o programa atinge 16% deles.
A Secretaria de Educação vai pedir às diretoras que incluam "regras de convivência" no regimento interno das unidades. Segundo a assistente especial da pasta, Maria Auxiliadora Albergaria, o pedido será feito ainda neste mês.
Ela diz que as "regras de convivência" estão em estudo há seis meses e foram aceleradas após o caso extremo da escola do Belém.
- São coisas simples, como suspensão para alunos que ofenderem o professor. Muitas escolas já têm isto e vão muito bem, mas outras agem como se não houvesse regra. E há - diz.
Segundo a Secretaria de Educação, o projeto começou em 2006 em escolas de Heliópolis, na zona sul da capital, e em Guarulhos, na Grande São Paulo. Nos últimos dois anos, foi expandido para São Bernardo do Campo, Campinas e mais dez bairros da capital. Agora, chegará a mais oito cidades e aos distritos de Marsilac, Parelheiros, Grajaú, Capela do Socorro e Cidade Dutra, todos na Zona Sul.
Segundo Maria Auxiliadora, o plano é ter a Justiça Restaurativa em toda a rede, mas a implantação pode demorar.
- Dependemos do Poder Judiciário, das ONGs e de muita coisa para adotar esse sistema - afirma.
Como funciona
O Justiça Restaurativa é acompanhado por juízes de varas da Infância e da Juventude das comarcas onde estão os colégios. Professores, funcionários, pais e voluntários são treinados para trabalhar como "facilitadores" no processo, chamado de círculo restaurativo. A intenção é que os envolvidos entendam o que fizeram e decidam entre si qual a melhor forma de lidar com a situação.
Maria Auxiliadora Albergaria afirma que em todos os locais onde o sistema foi adotado o resultado foi positivo.
- Em uma análise qualitativa todas as diretoras aprovaram - diz.
Com os círculos, os facilitadores passam a entender o que causa a violência e podem pedir ajuda aos órgãos como conselhos tutelares e secretarias de saúde.
Mesa redonda
Na Escola Estadual Salime Mudeh, em Guarulhos, o aviso de que a unidade conta com Justiça Restaurativa está logo na entrada. Nos corredores, há mais lembretes. Uma sala com paredes lilás, decorada com quadros e frases de efeito, além de uma mesa redonda, é reservada só para isso e tem agenda concorrida. "Tem fila para fazer o círculo", conta a diretora Nilma Maria Figueiredo. Ela conta que, no início, todos os casos eram tratados a convite da escola, mas agora há interessados que procuram o programa.
Para ela, o sistema, que já é aplicado há dois anos, ajudou alunos e professores a se conhecerem e aumentar o respeito mútuo. "A escola continua resolvendo seus próprios problemas, mas o fato de ter uma sala, com um método claro, faz a coisa ser mais séria", diz. Ela conta que nenhum estudante que passou pelo círculo teve reincidência. "Tem aluno que se metia em problema sempre. Depois que veio aqui, nós o entendemos e ele entendeu as conseqüências do que fazia: nunca mais precisamos dar bronca."
A Justiça Restaurativa é recomendada pela ONU (Organização das Nações Unidas), principalmente em casos onde os envolvidos terão que conviver. Ela é usada pelo poder judiciário em países como Nova Zelândia, Inglaterra, Austrália, Canadá, África do Sul e Colômbia.
No Brasil, um projeto experimental é desenvolvido desde 2006 em Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, e em São Caetano, no ABC.
Nas escolas estaduais, o projeto tem o apoio do Centro Internacional de Comunicação Não-Violenta e do Centro de Criação de Imagem Popular (Cecip). As ONGs fazem oficinas onde explicam aos facilitadores como executar o círculo.
O Globo. 08/12/2008.
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