Brasília, 21/06/2005 (MJ) – As práticas alternativas de solução de conflitos devem ser construídas por meio de políticas públicas coordenadas, com o envolvimento do poder público, da sociedade civil e dos organismos internacionais ligados aos diretos humanos. Essa é uma das conclusões a que chegaram os participantes da conferência internacional "Acesso à Justiça por meios alternativos de solução de conflitos", realizada em Brasília entre os dias 14 e 17 de junho, pela Secretaria de Reforma do Judiciário, em parceria com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud).
Ao final do evento, painelistas e participantes assinaram a Carta Brasília – Princípios e Valores de Justiça Restaurativa, que destaca 18 princípios que devem nortear as práticas restaurativas e suas respectivas políticas públicas, entre os quais o envolvimento da sociedade civil, a garantia irrestrita dos direitos humanos, o desenvolvimento de ações integradas, a inserção das pessoas envolvidas e a transformação de padrões culturais.
Na abertura dos trabalhos, foi assinado um termo de cooperação técnica para a implementação, no Distrito Federal, de um projeto piloto da Justiça Restaurativa, método alternativo de solução de conflito, na área penal, que coloca vítima e ofensor frente a frente. O acordo envolve o Ministério da Justiça, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal, a procuradoria-geral de Justiça do DF e a defensoria pública do DF.
Durante três dias, especialistas do Brasil, Chile, Argentina, Canadá e Nova Zelândia trocaram experiências sobre questões relacionadas a práticas alternativas de solução de conflitos, como a Justiça participativa – que prevê o envolvimento direto da comunidade -, técnicas de mediação civil e penal, e experiências comunitárias. Os participantes puderam entender o funcionamento dessas práticas em diferentes países, do ponto de vista da aplicação e dos resultados.
A conferência marcou ainda o lançamento do primeiro mapeamento brasileiro sobre sistemas alternativos de solução de conflitos, estudo que servirá de subsídio para a elaboração de políticas públicas voltadas à área. Também foi lançado um livro com artigos inéditos de especialistas brasileiros e estrangeiros sobre a Justiça Restaurativa.
Negociação – A Justiça Restaurativa, a ser adotada nas áreas penal e de infância de juventude, compreende um conjunto de práticas que visam aproximar as partes para que o resultado dos processos seja negociado e pactuado entre elas, com a aprovação do juiz. A idéia é, por meio da confrontação, chegar às causas que levaram o ofensor a praticar o crime e, a partir disso, definir em conjunto o que pode ser feito para minimizar os danos causados, não só para a vítima, como também para a comunidade envolvida e para o próprio réu. “Estado, juízes e a sociedade se preocupam muito com o infrator, o delinqüente e se esquecem da vítima”, defendeu o presidente do Tribunal de Justiça do Distrito Federal José Jeronymo Bezerra de Souza, na abertura da conferência. Além do Distrito Federal, o modelo será implementado de forma piloto também em Porto Alegre e em São Caetano (SP).
A filosofia do modelo restaurativo é tentar restabelecer as relações sociais entre as partes envolvidas num conflito que foi parar na Justiça e propiciar respostas mais efetivas aos delitos. Assim torna-se possível garantir maior grau de satisfação à vítima, como explica Renato De Vitto: “É importante incluir a vítima no processo penal para que a ação tenha um significado prático para ela. Isso pode muitas vezes significar a própria reparação dos danos, de acordo com a condição financeira do ofensor”.
A preparação para o encontro é feita por psicólogos, psiquiatras e assistentes sociais do Judiciário. Poderá envolver, ainda, familiares e membros da própria comunidade onde ocorreu o delito.
Cooperação internacional - A Nova Zelândia foi o primeiro país a adotar práticas de Justiça Restaurativa. Desde 1989, todos os processos que envolvem ato infracional praticado por menores são submetidos a reuniões com familiares dos envolvidos e representantes da comunidade para buscar a solução do problema. O modelo também é aplicado, em menor escala, nos processos criminais envolvendo adultos. Austrália, Reino Unido e Canadá são exemplos de países que desenvolvem experiências bem sucedidas nesse sentido.
Mapeamento – Realizado pela Secretaria de Reforma do Judiciário e pelo Pnud, o relatório “Acesso à Justiça por Sistemas Alternativos de Administração de Conflitos” reúne 67 programas sem fins lucrativos em funcionamento em todo o país. O mapeamento mostra que o sistema diferenciado de solução de conflitos representa para o brasileiro uma forma de substituição ao procedimento judicial comum, porém não pode ser considerado como forma alternativa à Justiça em si, uma vez que grande parte dos programas são patrocinados pelos Judiciários estaduais e Federal, ou funcionam por meio de convênios e parcerias.
O estudo identificou que essas experiências se concentram nas grandes cidades, sobretudo no Rio de Janeiro, São Paulo, Brasília, Salvador e Fortaleza. Apesar do crescente investimento nessas experiências por parte dos órgãos governamentais, o trabalho mostra que a injeção de recursos financeiros e humanos nos programas ainda é precária.
MJ.
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